Primeiros capítulos da CPI da caixa-preta da BHTrans
Trabalhos parlamentares sobre o transporte coletivo
Por 30 anos, a Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) operou de forma não transparente, sem dar a devida publicidade de seus atos e sem prestar contas de sua relação com as concessionárias do sistema de transporte coletivo de nossa capital. São três décadas de um serviço ruim, que sacrifica justamente a parcela mais humilde da população e, o mais grave, submete os belo-horizontinos ao jugo de empresários preocupados tão somente com o lucro.
Esta é a realidade que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da caixa-preta da BHTrans já constatou no início de seus trabalhos. Em apenas três reuniões para oitivas de testemunhas e recebimento dos primeiros documentos solicitados ao MP, ao Judiciário e ao Executivo, nos deparamos com uma montanha de irregularidades, desmandos e mau uso do dinheiro dos usuários do sistema de ônibus. Criada para oferecer transporte coletivo de qualidade e acessível, a empresa pública se desviou de seus objetivos e se tornou refém de um cartel.
Abordo em primeiro lugar uma atividade importante da CPI, que muitas vezes não chama a atenção de quem acompanha as investigações: a análise de documentos que são encaminhados ao colegiado. Foi a partir da leitura desses documentos que aprovamos a convocação de Daniel Marx Couto, diretor de Planejamento da BHTrans, Shaila Santos da Silva, da empresa Maciel Consultores, responsável pela auditoria fajuta feita em 2018, além de três donos de empresas de ônibus. Esta é a primeira vez que a Câmara Municipal de Belo Horizonte convoca para depor representantes do setor de transporte coletivo da capital.
Quanto às audiências, o primeiro a ser ouvido, na condição de testemunha, foi o atual presidente da BHTrans, Diogo Prosdocimi. Ele informou que a empresa não presta um bom serviço e não tem mecanismos eficientes de fiscalização e controle de qualidade pelas concessionárias. Também falou sobre o passivo trabalhista da empresa, de cerca de R$ 96 milhões. Na sequência, ouvimos o senhor Célio Bouzada, ex-presidente da BHTrans. Sua fala só serviu para comprovar a gravidade dos atos praticados pela BHTrans e pelas empresas de ônibus.
Bouzada afirmou que a retirada dos cobradores “foi uma retaliação das concessionárias” à prefeitura, pelo fato de o Executivo municipal não reajustar o valor das tarifas de transporte. Entretanto, ele não conseguiu explicar como em 2017, no cargo de presidente da BHTrans, deu aulas em um curso financiado pelo sindicato das concessionárias. E nem sequer se lembrou do valor que recebeu para participar do curso. Por essa razão, será convocado outra vez para depor na CPI, dessa vez como investigado.
Nesta semana, tivemos a participação de representantes dos movimentos sociais, que trouxeram informações sobre irregularidades no contrato de 2008 e apontaram evidências de formação de cartel por parte dos empresários. As denúncias serão devidamente apuradas. Como o volume de documentos tem aumentado, teremos na próxima semana, além da reunião ordinária, duas convocações extraordinárias.
Vamos ouvir integrantes das Comissões Regionais de Transporte e Trânsito (CRTTs), que fazem parte de um fórum de discussões das ações da BHTrans, e teremos os depoimentos de pessoas convocadas nessa quarta-feira. E é só o começo. Com o total apoio dos demais integrantes da CPI, a abertura da caixa-preta da BHTrans já é uma realidade, e vamos até o fim. Assumi esse compromisso em 2017 e nunca abri mão dele.
Publicado em Jornal O Tempo em 18/06/21.