O que fazer com nossos rios?
Após os trágicos resultados dos temporais de 24 e 28 de janeiro, que causaram a morte de 13 pessoas e deixaram um rastro de destruição em pontos diversos da capital, uma discussão se tornou urgente: o que fazer com os cursos d’água canalizados na cidade? Como a evitar a repetição das inundações e alagamentos nos próximos períodos de chuva?
Em primeiro lugar, é preciso lembrar que a violência das águas é consequência de um planejamento urbano equivocado, que começou a ser implementado ainda nos anos 1960, no qual os governantes que se sucederam desde então nunca prestaram a devida atenção.
Um vídeo ufanista, produzido em 1970, exaltando a canalização do córrego do Leitão, ganhou destaque nos últimos dias justamente por simbolizar esse grave equívoco urbanístico.
Foi este mesmo córrego do Leitão que, em 28 de janeiro, transbordou das galerias ao longo da avenida Prudente de Morais, invadiu prédios residenciais e comerciais, arrastou carros e causou um grande prejuízo até desaguar no Arrudas.
Como reação ao caos, a discussão sobre a necessidade de “destapar” os ribeirões e riachos canalizados em Belo Horizonte ganhou relevância e se tornou uma pauta prioritária para o futuro da cidade.
O tema será abordado com a importância que merece no seminário que a Câmara Municipal está organizando e que será realizado em março. Os principais objetivos dessa iniciativa são ouvir especialistas em planejamento urbano e, com o respaldo técnico delas, propor soluções para a recorrente e cada vez maior ameaça representada pelo período chuvoso na capital mineira. O arquiteto Sérgio Myssior será um dos convidados.
Tenho certeza de que o momento é de buscar novas abordagens para o velho problema das inundações na cidade. A construção de bacias de contenção, os chamados “piscinões”, apontada como uma boa solução de engenharia, não é a única solução viável. Vejam o que ocorreu em São Paulo na segunda-feira, quando os rios Pinheiros e Tietê transbordaram e paralisaram por 24 horas a maior metrópole do país.
Ao falar sobre a chuva, o prefeito Bruno Covas informou que em 2019 foram gastos R$ 800 milhões na construção de piscinões e que, para 2020, estão previstos investimentos ainda maiores. O que fica claro, no meu entendimento, é que os piscinões são obras de custo muito elevado e que, diante do aumento da intensidade das chuvas, fruto das mudanças climáticas, não garantem totalmente o fim das inundações.
Acredito que remover a pavimentação que cobre o Arrudas, o córrego do Leitão e o Acaba Mundo é uma proposta inovadora. Por essa razão, deve ser analisada em profundidade. Precisamos saber a que custo essa medida será implementada, o tempo para sua execução e que mudanças trará para o ambiente urbano e para a mobilidade.
Entretanto, duvido da eficácia de uma única iniciativa. A retirada da pavimentação dos córregos terá que ser ampliada com ações executadas de maneira gradativa e que terão impacto positivo. Substituir o asfalto por calçamento blocado em vias de menor tráfego de veículos aumentará a permeabilidade do solo e diminuirá a intensidade das enxurradas.
A ampliação e proteção das áreas verdes é outra proposta interessante. O importante é que esse debate tenha início o quanto antes, para agilizar a implementação das soluções que sejam aprovadas. Não dá mais para adotar apenas medidas mitigadoras dos problemas. A hora é de buscar e adotar novas formas de prevenção.
Publicado em Jornal O Tempo em14/02/2020.