Riksdagen
Riksdagen

não existe um Eduardo Cunha na Suécia (e Dilma segue lá)

Nessa sexta-feira, 17 de julho de 2015, mergulhei na leitura do livroUm país sem excelências e mordomias” (Geração Editorial), de Claudia Wallin. Recomendo. Trata dos políticos suecos. Em poucas horas, eu terminei. Não consegui parar de ler. Iniciei a leitura em Oslo, na Noruega, e terminei em Estocolmo, na Suécia. Foi como se eu tivesse me teletransportado de um lugar para o outro! Estava tão atento que não vi o que se passou ao meu redor durante a viagem. Soube, pelo whatsapp, que a sexta-feira foi agitada no Brasil. O motivo? O deputado federal pelo PMDB do Rio de Janeiro, Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados no Brasil. Na quinta-feira, um delator o enrolou na Operação Lava-Jato. Hoje, ele rompeu com o governo (embora, seu partido não tenha feito o mesmo mantedno os milhares de cargos e vantagens), abriu duas Comissões Parlamentares de Inquérito e foi a rede nacional de telvisão dizer que o poder legislativo está trabalhando… Sei. O interessante nisso é que não me lembro de ver um Presidente da Câmara ser oposção. Vai ser divertido. Por aqui, visitei o Parlamento Sueco. Vamos comparar um pouco o Brasil com a Suécia. E, advirto, mesmo com essa fumaça toda na política brasileira, o impeachment ainda me parece muito improvável.

No inferno, os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise. Dante Alighieri

A – A Suécia é uma monarquia constitucional parlamentar dualista. O chefe de estado é o rei. O chefe de governo é o primeiro-minsitro. O parlamento sueco, ou Riksdag, possui 349 assentos. É um número ímpar para não dar empate. Os parlamentares são eleitos pelo voto proporcional. O edifício do Riksdag está localizado na Helgeandsholmen, uma pequena ilha ao centro de Estocolmo, que vejo da janela do hotel. Ocorrem três visitas por dia durante a semana.

B – Os partidos políticos na Suécia dão gosto! Trata-se de instituições sólidas com ideologia visível. A social democracia sueca, por exemplo, é de fato um partido social democrata! Pode parecer óbvio, mas não é assim no Brasil…

C – Claudia Wallin morou na Suécia por dez anos. Conversou com deputados que desconhecem mordomias e o tratamento de “excelência”, que não aumentam o próprio salário e – acreditem – não entraram na vida pública para enriquecer ou levar vantagem. E explica como funciona o sistema político sueco em seu livro, baseado em três pilares: transparência, educação e igualdade. Por tudo isso, trata-se de uma leitura capaz de provocar vergonha e raiva no leitor e no eleitor brasileiro – dois sentimentos que podem ser um bom começo para a mudança.

D – A Suécia não oferece luxo ou privilégios aos seus políticos, ao contrário do Brasil. Parlamentares suecos vão de ônibus ou bicicleta para o trabalho e viram manchete de jornal quando se atrevem a pegar um táxi com o dinheiro do contribuinte. Vivem em apartamentos funcionais que chegam a ter 18 metros quadrados, e onde não há comodidades como máquina de lavar – as lavanderias são comunitárias.

E – O ministro sueco Anders Borg, que em 2011 foi eleito pelo jornal britânico ”Financial Times” como o melhor ministro das Finanças da Europa, vive na capital em um apartamento conjugado de cerca de 25 metros quadrados.

F – Nenhum deputado sueco tem direito a pensão vitalícia, plano de saúde privada nem imunidade parlamentar. Nenhum político sueco tem o privilégio fabuloso de poder aumentar o próprio salário. Parlamentares suecos trabalham em gabinetes de cerca de 15 metros quadrados, e não têm direito a secretária, assessor nem motorista particular. Vereadores suecos não recebem sequer salário, e não têm direito a gabinete – trabalham de casa.

GNa concepção sueca, sistemas que concedem privilégios e regalias aos políticos são perigosos, pois transformam políticos em uma espécie de classe superior, que não sabe como vivem os cidadãos comuns. Dessa maneira, conforme sublinham vários políticos suecos, cria-se uma distância entre o povo e seus representantes, o que por sua vez gera um sentimento de desconfiança e descrença da população em relação aos políticos.

H – A Suécia tem uma história marcada por uma longa tradição de democracia, e por um forte sentimento de igualdade entre as pessoas. Mesmo durante o período de poder monárquico, ao lado do rei sempre existiu um parlamento, e já na Idade Média havia a participação de pessoas comuns e camponeses nas assembléias políticas, ao lado do clero e da nobreza. Ao longo dos tempos, foi preciso lutar contra o poder do rei e os privilégios da nobreza. O rei perdeu todos os poderes na década de 70, e o desenvolvimento da democracia sempre esteve associado aos valores igualitários da sociedade sueca: ninguém deve ser melhor do que ninguém, e isso inclui a classe política. Políticos suecos sabem que não estão no poder para enriquecer, e sim para representar os interesses da sociedade como um todo.  

I – Já no Brasil, ainda vigoram o conceito patrimonialista e os privilégios políticos que marcaram o processo de formação do Estado brasileiro, com a visão de que a coisa pública não é de ninguém. O interessante é notar que a Suécia, que juridicamente ainda é uma monarquia, conseguiu concretizar o ideal republicano. O Brasil, que formalmente é uma república, ainda é um país de súditos.

J – A educação é um dos pilares fundamentais da democracia sueca, e a base de todo grande salto no processo de desenvolvimento democrático de uma sociedade. Na Suécia, o ensino é gratuito e de qualidade para todos até a universidade, o que sem dúvida se reflete no alto grau de conscientização política dos cidadãos. Existe uma clara consciência aqui de que os políticos são eleitos para servir, e não para serem servidos. Política também não é algo que se discute apenas em ano de eleição, e embora o voto não seja obrigatório na Suécia, o índice de comparecimento às urnas no país tem se situado historicamente entre 80% e 90%. E esta sociedade mais consciente não dá privilégios aos seus políticos, nem aceita os desvios do poder. Os movimentos de grupos organizados da sociedade civil também foram essenciais para o processo gradual de construção da cidadania na Suécia, assim como as políticas igualitárias de inclusão, que possibilitaram o acesso de todos os cidadãos a serviços básicos de qualidade e reforçaram a noção de que todos têm os mesmos direitos.

K –  A real motivação de qualquer cidadão para entrar na política deve ser o poder de influenciar os rumos de uma sociedade e as decisões que beneficiam o interesse coletivo, e é isso que a maioria dos suecos parece privilegiar. Para aqueles que atingem o topo da carreira política, como por exemplo é o caso do exercício de cargos ministeriais, os salários também estão bem acima da média salarial da população. E é claro que o poder sempre exerce fascínio. Na Suécia, todavia, o poder político exclui a obtenção automática de privilégios pessoais pagos com o dinheiro do cidadão, como passear de jatinhos ou helicópteros com a família, a babá e o cachorro.  Os suecos não querem ver seus políticos levando uma vida de luxo. Você caminha pelas ruas e vê ministros andando. Todos vivem vidas normais.

L – O primeiro-ministro sueco afirmou o seguinte sobre a política brasileira: ”Em primeiro lugar, é muito importante dizer que respeito o fato de que o Brasil é uma democracia e que portanto cabe àqueles que são eleitos pelo povo responder a este tipo de questão. Contudo, para dizer o óbvio, se eu fosse o ministro da Fazenda do Brasil e tivesse que fazer um corte de gastos, eu saberia exatamente por onde começar. Porque quando um político precisa cortar gastos, é muito importante mostrar que ele próprio dá o exemplo. No nosso país, as pessoas estão sempre atentas aos custos da burocracia e da classe política. Se um político quer manter a confiança dos eleitores, deve estar próximo das pessoas.”

M – E se um político sueco é denunciado num esquema de corrupção? Em primeiro lugar, toda e qualquer quantia indevidamente apropriada por um político deve ser imediatamente devolvida aos cofres púbicos. Em segundo lugar, começa o processo mais temido por um político sueco: a execração pública na mídia, que inevitavelmente ceifa as chances de uma reeleição. Um dos casos do livro é o de um ex-líder do Partido Social-Democrata, que renunciou na esteira de um escândalo provocado pela revelacao de que a companheira dele não pagava para morar no apartamento funcional onde viviam. Sim, porque na Suécia o Estado só paga apartamento funcional na capital para o político: se a esposa decide morar lá, tem que pagar pela metade do valor do aluguel. O líder jurou que não sabia das regras, mas pagou prontamente todo o dinheiro devido aos cofres públicos – e sumiu nas sombras do partido. Outro exemplo é o caso das duas ministras obrigadas a renunciar em 2006 poucos dias após sua nomeação, diante de revelações de que haviam empregado babás sem recolher os devidos impostos: pagaram o que deviam, e abandonaram a carreira política. A lei sueca não prevê penas especialmente duras para casos de corrupção política. O diretor da Agência Nacional Anti-Corrupção sueca afirma no livro que quem pune políticos corruptos é a opinião pública. Políticos corruptos não são reeleitos na Suécia, o que naturalmente é reflexo do nível de escolaridade e conscientização política do eleitorado.

N – É preciso dizer que o estilo sueco de fazer campanha eleitoral é marcado pelo debate exaustivo e detalhado de propostas concretas de governo, e pela  ausência de ataques pessoais entre adversários. Candidatos em geral não se atacam, e não se atracam. Existe um respeito comum à democracia, que é também uma exigência do eleitorado: várias pesquisas apontam que o eleitor sueco costuma punir nas urnas os candidatos que assumem atitudes mais duras contra seus oponentes.  Na campanha das eleições gerais realizada, um dos principais temas do debate foram as propostas para a geração de empregos, diante do nível de desemprego particularmente alto entre os jovens. Outro tema central foi a educação – os suecos querem melhores resultados no desempenho escolar, e a redução do número de alunos por turma nas salas de aula. A questão da imigração foi um dos temas mais polêmicos na profusão de debates e duelos políticos diários, diante do número cada vez maior de refugiados que chegam ao país fugindo dos conflitos no Oriente Médio – mais 80 mil são esperados este ano – e do crescimento do apoio ao partido da extrema-direita, o Sverigedemokraterna (”Democratas da Suécia”) – que, após as eleições, diante de uma Suécia em choque, acabou se tornando o terceiro maior partido do país. Ideologicamente, os conceitos de esquerda e direita ainda vigoram, embora haja uma tendência acentuada dos principais partidos políticos em direção ao centro. A social-democracia sueca, que serve de referência para o mundo, mantém sua visão essencialmente igualitária de país: uma sociedade com a menor distância possível entre ricos e pobres, e também com a menor distância possível entre aqueles que detêm e o poder e os que lhes dão poder através do voto.

OO livro mostra que a Suécia já foi um país bastante corrupto, e há pouco mais de cem anos era um dos países mais pobres e atrasados da Europa. O que os suecos fizeram foi transformar a sua própria história, através de investimentos maciços em educação e pesquisa, de políticas de promoção da igualdade social e de uma série de reformas abrangentes que aperfeiçoaram gradualmente as instituições do país. Hoje, a Suécia é uma das mais ricas e prósperas nações industrializadas do mundo, um dos países menos corruptos do mundo, e uma sociedade que não aceita os desvios do poder. E se a Suécia transformou a própria história, o Brasil também pode melhorar a sua.  O caminho passa pelo maior acesso da população a uma educação de qualidade, pela maior conscientização popular sobre a importância da participação política, e por reformas relevantes nas instituições do país, como a reforma política. É também preciso reconhecer os avanços que têm sido feitos, como a lei da transparência e a lei anti-corrupção. Mas será preciso também mudar uma mentalidade.

P – Os prefeitos e governadores não possuem residência oficial. Os deputados estaduais, além dos veresadores, também não recebem salário. O salários dos deputados federais equivalem ao dobro de um salário de professor. Na Suécia, não há imunidade parlamentar. Uma vice-primeira minsitra foi cassada por comprar uma barra de chocolate com dinehiro público. No Brasil, há quem diga que se político não recebesse salário, ninguém gostaria de ser um. Isso é mentira. Um grande mentira.

Q – Há razões para que a Suécia seja um dos lugares menos corruptos do mundo. Em primeiro lugar, a lei de acesso público aos documentos oficiais. Esta lei, criada na Suécia há mais de duzentos anos, evita os abusos do poder. Se os cidadãos ou a mídia quiserem, podem verificar o salário, os gastos e as despesas das viagens a trabalho. Os arquivos são abertos ao público. Ao colocar os documentos e registros oficiais das autoridades ao alcance do público, evita-se que os indivíduos que exercem posições de poder pratiquem atos impróprios. Esta é a razão principal. Em segundo lugar, é preciso citar a lei aprovada na Suécia há cerca de 200 anos que introduziu o ensino compulsório no país e aumentou o nível geral de educação da população.

R – Nos ultimos 30 anos, houve dois casos graves de corrupção na Suécia. E notem que curioso: não há previsão de pena grave par os casos, pois os suecos compreendem que não é a pena que resolve o problema.

S – Que tal? Estou diante de uma realidade muito distante da nossa certo? Volto ao Brasil. As notícias dessa semana somam mais dados à crise politica e à crise econômica que vive o país. Não possuísmos um sistema parlamentar. Ainda bem! Gosto muito do sistema parlamentar, mas da forma como estão estruturados os partidos e da forma como se elege deputado federal, prefiro que assim seja. Todavia, como não estamos num sistema parlamentarista, a chefia de governo e a chefia de estado estão concentradas na presidente. Na teoria, o presidencialismo lida com uma figura forte. Contudo, Dilma Rousseff é uma figura fraca. Tratei dos motivos disso aqui. O enfrentamento dos petistas a Eduardo Cunha é uma coisa maluca. Em teoria, PMDB e PT são aliados! Imagine isso na Suécia, onde coalizõesde governo se dão de verdade…

TO Brasil possui 57.434 vereadores, 1.059 deputados estaduais, 513 deputados federais e 81 senadores. Dentre esses quase 60.000 membros do poder legislativo  (imaginem o custo disso!) nenhum tem tanto poder quanto Eduardo Cunha, obviamente. Com as declarações do deputado, muita gente começou a me perguntar se eu achava que Dilma Rousseff agora deveria ficar mais preocupada…

U – Há aquela velha máxima para quem está no inferno. Voces já conhecem e sabem quem deve ser abraçado. A Presidente da República está no inferno. Todavia, ela não está lá sozinha. Eu não caio no papo de Eduardo Cunha. O PT e o PMDB governam o Brasil juntinhos há mais de uma década! É uma relação onde a troca de vantagens não tem fim. O deputado em questão ganhou notoriedade recentemente por ser habilidoso na construção de uma base parlamentar suprapartidária que lhe garantiu a eleicão e lhe confere poder. O PMDB já existe há mais tempo. Ele rompeu com o governo? Muito bem… E os minsitérios do PMDB? E os cargos do PMDB? E as emendas do PMDB? E os esquema do PMDB? O PMDB é coisa para deixar sueco sem dormir.

V – O PMDB disse que teria candidato a presidente em 1994. O PMDB disse que teria candidato a presidente em 1998. O PMDB disse que teria candidato a presidente em 2002. O PMDB disse que teria candidato a presidente em 2006. O PMDB disse que teria candidato a presidente em 2010. O PMDB disse que teria candidato a presidente em 2014. Em 2018, vocês acham que o PMDB vai dizer o que? Eu sei que há muita gente que não consegue entender como Dilma Rousseff se mantém no cargo. Eu explico: há no Brasil um presidencialismo tão forte, mas tão forte, mas tão forte ao ponto de fazer uma criatura como ela com a faixa no peito. Sustento a minha tese. Enquanto houver governo, o PMDB estará nele. Há cargos? Há dinheiro? Há poder? O PMDB não vai ser mexer.

X – Odeio ser estraga-prazeres da turma que deseja o impeachment. Aliás, eu não desejo, nem desdejo. Para mim, é só mais uma das disposições do texto constitucional que deve ser apliacada como se prevê no caso correto considerando os fatores políticos. A questão é essa. E vou sublinhar: o PMDB! É o PMDB que vai decidir. Eduardo Cunha não é o PMDB! Não é. Eduardo Cunha rompeu com o governo. O PMDB não. E afirmou isso em nota.

WDilma Rousseff só é possível por conta do PMDB. O PMDB só é possível por quê o Brasil não é a Suécia. Se a presdiente tiver de ser afastada, que seja! Eu adianto que isso não vai ser a panacéia da doença nacional. Não vai mesmo! Lamento informar.

Y – Alguns amigos estão apostando que eu estou errado. Eu estou dobrando as apostas. Já estou pedindo datas! Eu acho que Dilma Rousseff deixa de ser Presidente da República em 1º de janeiro de 2019. Quem acha que vai ser antes pode casar a aposta comigo. Quer quebrar a banca! Queira o Brasil que eu esteja errado. Ela aguenta ficar lá. O que vai sobrar do país é que me preocupa.

Z – É triste ver os diferentes níveis em que se encontram Brasil e Suécia. É triste mesmo. Todavia, considero muito motivador saber que por aqui as coisas iam muito mal há cem anos e melhoraram consdieravelmente. Está na hora de pensar nos nossos netos e colocar a mão na massa. E se for só um que pensar assim, não vai aidantar muito, mas vai adiantar um pouco. Quanto mais gente melhor. Acredito que esse texto posso ajudar nessa argumentacão. O Brasil anda precisando de notícias melhores.